terça-feira, 19 de maio de 2009

Haidamaky --- Banquete em Lysianka

Taras H. Shevchenko

Tradução de Mykola Szoma
(Shchoma Mykola Opanasovych)

Entardecia... De Lysianka,
ao redor, tudo ilumonou-se:
Era Honta e Zalyzniak ---
seus cachimbos acendiam.
Horrívelmente fumaram tanto
que até no inferno não se faz
tanta fumaça como produzir.
Hnylyj Tykych todo vermelho,
tingido de sangue mercantil e
da nobreza dos dvoriany.
As labaredas encobriram
as simples choupanas e
as mansões de renome;
Parece que a sorte dá o castigo
ao todo poderoso e, também, ao
pobretão --- aquele sem nome.

No centro da praça
o Honta hirsuto, ao lado de Zalyzniak,
ordena aos gritos: "Morte aos lyakhy!
Castigo sem tregua! Se arrependam!
--- de nos terem zombado. Aprendam".
Os rapazes aplicavam os castigos.
Todos gemiam, choravam, gritavam
--- não achavam abrigos. Maldiziam,
outros rezavam: perdão, aos já mortos,
pediam. Confessavam pecados; porém,
nem assim sobreviviam. E, ...morriam!..
A morte severa a todos levava
--- não dava ouvidos aos gritos
nem os anos em conta apontava;
meninas, donzelas e velhos:
a todos ceifava. Mesmo um aleijado
que houvesse, a ela não escpava.
Não restou uma alma viva
que, da hora vingativa,
pudesse contar a história, ---
de como arderam as chamas
da festa macabra de Lysianka.

Gritava Halaida... enfurecido gritava:
"Gastigo aos lyakhy, castigo!"
Até parecia um doido ---
por sobre os caidos pisava;
os já mortos, incinerar mandava.
"Mais um lyakhy, um inimigo!
Muito pouco... tragam mais!
O mar é pequeno... é vermelho demais...
Oksana! Oksana!
Onde estás tu?" --- seus gritos ecoam;
saidos das chamas. Labaredas encobrem
os seus ziguezagues bestiais...

Neste instante, os haidamaky
estenderam as mesas na praça
--- era hora de ingerir alimentos;
conseguidos alhures, sem pejo.
Um jantar, antes do sol se deitar.

"À farra!" --- todos gritaram.
Ao redor da mesa se postaram.
Mais além, o inferno a tudo envolvia.
Entre as labaredas, vultos em brasa
--- senhores de outrora; nada agora!
Junto aos caibros, todos queimando.
"Bebam, rapazes! Bebam!
Derramem toda a bebida;
talvez encontremos outros senhores
--- então, uma nova farra teremos!"

E, Zalyzniak, numa tragada só,
com maestria, a sua taça enxuga.

"Sufrago pela alma dos que partiram
--- os malditos condenados a purgar
os seus pecados na terra cometidos.
Bebamos mais, rapazes! Bebamos!..
Meu irmão Honta, bebamos mais!
À farra, todos! Todos aos pares.
Onde está o Volokh?
Venha cantar-nos... ó, velho kobzar!
Mas não nos cante dos nossos pais.
Os nossos atos também são imortais
--- soubemos derrotar os inimigos;
também, não fales sobre a tristeza ---
alegres somos: só vejas esta mesa...
Uma canção alegre executes,
até que a terra toda estremeça ---
mostre-nos uma donzela, uma viuva.
Como contê-la entre os abraços,
até que totalmente ela se aborreça".

Kobzar (tocando e cantando)

"De vilarejo em vilarejo ---
por toda a parte,
só se ouve a música e
se dança com arte.
Vendi os ovos e a galinha;
comprarei sapatos amanhã.

De vilarejo em vilarejo ---
por toda a parte,
só se dança com arte:
Não tenho vaca,
não tenho toro;
tenho uma casa
em que eu moro.

Venderei esta casa.
Talvez, até de graça darei
ao meu compadre... Farei
uma tenda beirando mural
-- venderei bebes e comes.
Que tal?

De farras, a vida levarei ---
dançarina eterna eu serei!
Ouçam, meus filhos:
Mus frágeis pombinhos,
Nã se entristeçam!..
Apreciem os passos meus
-- de dança os compassos,
são vossos abraços. Tereis
seus sapatos vermelhos e,
tereis a escola. Vos darei!.."

"Muito bem! Muito bem!
Queremos que dance agora.
És kobzar e tua é esta hora!"

O cego tangeu as cordas;
agachado, jogou as pernas
de um lado para outro --- e,
saltitando dançava o hopak.

A praça toda estremecia ---
vergava a terra sob os pés...
"Entre na dança, Honta!"
"Vamos então, irmão Maksym!
Enquanto vivos estamos. Afinal,
nós irmanados somos por que!"

"Não se espantem
que sou maltrapilho;
meu pai sempre foi honesto
--- como ele, também sou".
"Estás certo, irmãozinho ---
por Deus, juro!"
"Vez agora é tua, Maksym!"
"Espere um pouco... mais um pouco só!"

"Desse jeito, como eu faço:
ame a filha, seja ela de quem for
--- pode ser do padre, ou do sacristão,
também pode ser a do campônio.
Desde que seja bela e aceite a tua mão".

Alegres, todos dançando;
Halaida fechado em si mesmo
--- sentado na ponta da mesa,
nada ouvindo, nem vendo;
apenas triste chorando.
Até parece uma criança.
Mas chora por que? Direi agora:

Vestido de zhupan vermelho...
Tem glória, tem ouro e tem fama;
porém, não tem junto de si
a sua querida Oksana.
Não tem com quem dividir a sorte desdita,
nem cantar os sofrimentos, ao lado daquela,
que poderia minorar as suas dores: Só ela!..

Mas o Halaida não sabe,
que a sua Oksana,
do outro lado do rio,
os seus dias afoga em tristeza
--- nos umbrais e janelas dos lyakhy,
daqueles que o seu pai trucidaram.
Como outros irmãos --- seus patrícios,
escrava de nobres velhacos ela ficara.

Os raios das luzes,
de Lysianka em chamas,
as janelas todas iluminam e
induzem ao pensamento:
"Onde estará o meu Yarema?" ---
pensando assim, Oksana clama.
Não sabe ela, que está ali
o seu amado, sofrendo em Lysianka.
Não mais um simples maltrapilho;
agora é um mandante,
vestido de zhupan vermelho.

Sentado junto à mesa, ele pensa:
"Onde estará a minha Oksana?
Minha querida, minha pombinha.
Submissa, estará chorando?.."
Abatido, sobre a mesa se reclina.

Na encosta
um vulto cossaco
leve se desloca.
"Quem é?" --- Pergunta Halaida.
"Sou mensageiro do Honta.
Ele está se divertindo ---
eu não tenho pressa".
"Mas eu tenho; fale logo,
seu Leiba cachorro!"
"Deus me livre, não sou Leiba!
Estás me vendo? Sr. Haidamaka!
Eis a kopiyka... Queiras ver!..
Ou, tu não a conheces?"
"Sim, conheço! --- sacando da botina
o tarani bento. --- Quero a verdade.
Onde está a minha Oksana?" ---
Meneou as mãos...

"Deus a guarde!..
Está com os senhorios...
nos aposentos. Coberta de ouro".
"Quero a tua ajuda!
Tua ajuda agora, ó maldito!"
"Sim senhor! Agora mesmo...
Sr. Yarema enamorado!
Irei agora libertá-la:
Um bom dinheiro consegue tudo.
Direi aos lyakhy --- ao invés de Pac..."
"De acordo! Entendo a trama.
Depressa! Que vas agora!"
"Vou indo já, agora!
Mantenham o Honta se distraindo;
que ele se divirta até a meia-noite.
O resto fica por minha conta...
Saber quero apenas:
levá-la devo para onde?"
"Para Lebedyn!
Para Lebedyn, --- ouviste?"
"Ouvi, ouvi".

A bailado cossaco continua.
Halaida e Honta hopak saltitam e
Zalyzniak toma a kobza;
ferindo-lhe as cordas,
convida o kobzar
para que este mostre
como sabe ele dançar.
"Kobzar é tua vez agora
--- enquanto eu tocarei,
dançarás tu a tua hora".
E começou o dançarino
--- tomou a conta do bazar.
Saltitando se animou tanto que,
a seguir, começou a cantar:

"Nos jardins há pastinacas...
Eu não sou o teu cossaco taco?
Ou será que não te amo?.. Te amo!
Não daria eu te sapatos lindos?..
Sim, daria!.. Compraria tudo novo
para a minha moreninha ---
a amada de olhos castanhos".

"Hup-lá!.. Hurra! Hip.. hopak!
Apaixonou-se pelo cossaco,
que era um ruivo e muito velho
--- que sorte ingrata era a dela!..

Ó sorte! Siga a sua desventura
e tu --- ó velho!, saias desta com finura.
Eu, por mim, irei até à taverna.
Tomarei um gole, tomarei dois goles;
um terceiro, para sentir-me mais triste.
Mais um gole --- um quinto, um sexto,
até o final... Vejo mulheres bailando,
seguidas por um pardal.
Sapateando --- batendo os pés,
saltitando --- palmas batendo...
Mas não te acanhes, ó pardal!..

O velho ruivo convida uma velha para dançar;
recebe, em troca, uma figa --- sem disfarçar.

Depois: "Seu capeta traquinas, por que
não te casas, para não vadiares pelas esquinas;
deverias aprender a descortiçar o painço ---
alimentar as cianças e, de seus filhos cuidar.
Da minha parte, eu vou os meus proventos ganhar;
e tu, já velho de idade, não peques tanto assim ---
é melhor que, numa estufa, te busques aquecer.
De bruços deitado, respirando sem esmorecer".

"Quando eu era mais novinha e mais agradável,
pindurava a minha zapaska no postigo de janela;
e quem por ali passava --- sempre a notava.
Acenava e sussurrava; depois, para mim piscava.
Enquanto em seda eu bordava, pelo postigo,
o passeio dos rapazes deliciosamente apreciava!
Eram os Semen, eram os Ivan
--- todos vestidos de zhupan...
Passeavamos pelos campos;
depois, cantavamos todos ambos".

"Que se tranque a poedeira numa gaiola,
os pintinhos --- seus filhinhos, na primeira..."
............................................
............................................
"Eia! Hurra! Entortou o velho a ferradura;
a mãe puxa a barrigueira --- filha, força!
Amarre agora, na parte traseira".

"Mais ainda? Ou, já basta?"
"Mais um pouco!
Não sendo eu assim bela!
Porém, são pernas próprias que me carregam."

"Ah! Sirva um drinque de syrivets
com agárico e salsinha picadinhos:
Com babunha e didunha,
sempre juntinhos, ---
felizes e sorridentes!

* * *
"Ah! Sirva um drinque de syrivets
com agárico e salsinha picadinhos:
.....................
.....................

* * *
"Ah! Sirva um drinque de syrivets
com rábano-bastardo picadinho:

* * *
"Ah! Sirva água, muito mais água; depois,
procuremos um caminho pelo rio --- um vau!.."

"Basta! Basta! --- grita o Honta.
Basta, anoitece.
Rapaziada, luz acendam!..
E o Leiba onde está?
Não chegou ainda?
Encontremo-lo, agora.
Que enforcado ele seja! Ali... --- lá.
Porcalhão de botoeira!
Rapazes, Halaida! Já se apaga
o lampião cossaco".
Responde o Halaida: "Otamano!
Passeiemos, ó meu caro!
Vejas --- há labaredas; lá na praça,
que todos vejam
as chamas limpando tudo.
À dança. Vamos, toque a kobza!"

"Não. A dança não mais se coaduna!
Agora, mais fogo precisamos implementar!
Tragam mais alcatrão e mais estopa!
Tragam morteiros ---
lancem obuses sobre os esconderijos!
Que ninguem pense, que estou brincando!"

Os haidamaky puseram-se a gritar.

"Muito bem, nosso guia! Estamos ouvidos!"

Pelo açude se lançara,
os haidamaky gritando e cantando.
Lá de longe, o Halaida clama: "Guia!
Esperes por mim!.. Perdido, eu estou morrendo!
Tenhais misericórdia, não queimeis:
Lá está a minha Oksana! Compaixão dela tenhais!
Mais uma horinha, apenas
--- para que eu possa resgatá-la!"

"Está bem!.. Zalyzniak,
ordene para que incendeiem.
Ela partirá junto com os lyakhy...
E tu, pombo apaixonado,
encontrarás uma outra".

Olhou para trás ---
não mais viu o Halaida.
Brada o monte --- a velha fortaleza,
com os lyakhy se diverte,
esbarrando até as nuvens.
O restante, transformou-se num inferno...
"Onde está o halaida?" --- Maksym chama.
Nem sinal dele restou...
--- No silêncio mergulhou.

Enquanto os rapazes dançavam,
Leiba com o Yarema,
nos esconderijos do forte,
de mansinho se infiltravam.
Resgatarm a Oksana --- já quase sem vida.
Yarema, cumprindo as ordens,
levou a Oksana até o Lebedyn...

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Hnyly Tykych --- Rio sobre o qual está o vilarejo de Lysianka. É afluente de Buh.
dvoriany --- Grandes proprietários de terras, latifundiários
Leiba --- Era um taberneiro que, depois de ser caloteado pelos confederados,
juntou-se aos haidamaky
Haidamaka --- Forma singular (caso nominativo) de haidamaky
kopiyka --- Havia uma lenda de que uma moeda de 1 kopiyka com esfígie de
Kateryna II (1 copeque, moeda de liga de prata, equivalia a 1 centésimo
de rublo) servia de identificação entre os haidamaky.
ao invés de Pac --- Referência original ao Pac (Jan Pac) se fez em "Haidamaky -
Introdução"
Lebedyn --- Monastério feminino que ficava no vilarejo de nome igual
bazar --- Lugar a céu aberto, onde se faz o comércio em geral, ou uma praça onde
se reune o povo
pastinacas --- (pastinagas) Plural de "pastinaca", ervas eurásias, com folhas pinadas
e umbelas compostas de flores amarelas e muitas sementes ovais
achatadas
cossaco taco --- cossaco corajoso (adj. taco = corajoso)
zapaska --- Vestimenta feminina que era usada em substituição à anagua (saia
de baixo)
drinque de syrivets --- Bebida fermentada, feita de farinha
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05/19/2009

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