Perebendya
Taras Shevchenko
1839 St. Petersburg
Tradução de Mykola Szoma.
(Shchoma Mykola Opanasovych)
Perebendya, um velho cego
- quem não o conhecia?
Estava em toda parte,
a sua “kobza” tocando ---
sempre presente se fazia.
E quem toca, é muito conhecido
- todos eram lhe gratos,
por espantar-lhes suas mágoas;
porém, ele sozinho, andava só e aflito.
Levando a vida de abandono,
nem possuía um abrigo seu.
Neste mundo não lhe coubera
um lar paterno e um telheiro
– vivia só, ao léu...
Seus lábios tristes pranteavam de infortúnio
e a cabeça branca, por anos envelhecida,
tingia de rara lucidez seus olhos verdes
que, em quantos dele se aproximavam,
uma luz límpida de um saber suave enchia...
E o velho, já cansado, a “kobza” dedilhando
nem se importava – nem mesmo os ouvia!?
Cantava apenas os seus cantos sonolentos
- dos verdes prados, qual brisa suave, murmurando...
Lembrava tempos passados – um dia fora jovem!
Quanta saudade retratavam seus olhos embaçados.
Agora, qual órfão, só e sem ninguém no mundo,
aos poucos, de cansaço o semblante seu se cobria.
Calmo despede-se, dos presentes à sua volta
- precisa descansar... Amanhã será um novo dia!
Sua cabeça branca, na fria cerca orvalhada,
já adormecia. Kobza, silente e debruçado, dormia.
Se em risos o coração se desmanchava
- então os olhos choravam de cegueira,
porque não tinham provado dos ventos a meiga brisa
que outrora, por razões não óbvias, ignoravam.
Assim era o Perebendya:
velho e muito quimérico!..
Ao ruão dedica um canto;
depois, à Horlytsya passa.
Às meninas, nas pastagens ---
canta Hrytsya e Vesnyanka
Aos rapazes, em tavernas ---
Serbyna e Shynkarku tocava.
Com os casados banqueteava
(onde uma sogra má havia).
Ali, ele dos álamos lembrava e,
do destino perverso falava; depois
--- entre os arvoredos tudo terminava.
Onde um bazar havia,
ali do Lázaro o poema recitava;
ou, para que soubessem,
em tom melancólico contava,
de como a Sich arruinavam.
Assim era o Perebendya.
--- Velho e quimérico humorista!
Começava cantando; depois,
caia num riso. E terminava ---
Sempre, como um menino, chorando.
Sopram ventos,
tempestades rugem.
Vão varrendo os campos.
Num kurhan-outeiro, o kobzar sentou-se;
tirou da sacola a kobza e tangeu as cordas.
Ao redor seu vastos prados, como se ondas
de azuis águas --- lá dos mares,
de mormaço os ares encheram...
Por detrás de cada outeiro,
outros outeiros emergem...
Mais além, --- nada se avista;
sombriamente, algo se perde de vista.
Grisalho o bigode e o velho topete
baloiçam ao vento. Olhos choram,
e a cegueira sua todos ignoram!...
Os ventos cessaram...
O velho se esconde por trás dos outeiros,
para que ninguém o veja triste.
Para que os ventos levem --- as suas palavras,
pelos campos, como se elas de Deus fossem.
O coração, às vezes conversa com Deus,
às vezes a Sua glória proclama; enquanto
o pensamento, sobre as nuvens navega...
Como águia navega, plana nas alturas
--- espaços azuis, com asas, fustiga;
repousa nos raios solares... E indaga:
Em que aposentos eles dormem --- e,
de que modo se levantam. Por que?..
Ouve o cochichar dos mares.
Quer saber do monte: "Por que ele é mudo?"
Voa de novo às nuvens --- beirando os céus.
A terra é triste... --- Muitos pesares e dores.
Na vastidão da sua largura, refúgio não há...
Nem mesmo, para Quem tudo sabe;
nem mesmo, para Quem tudo houve:
O que dizem os mares, onde o sol dorme.
Não há quem O aceite. No mundo, não há...
Entre todos, ele é só, como um sol distante.
Conhecido é do povo... --- a terra o carrega;
Porém, se soubessem que ele é sozinho ---
que canta nas tumbas, com os mares parola,
das suas palavras divinas não fariam risos...
Talvez, o chamariam de tolo e de simplório
--- para longe dele se afastariam.
"Que pelas águas passeie!" --- diriam:
Muito bem. Oh, kobzar velho!
Muito bem que ainda tu andas:
canções fazes e palestras,
sobre os kurhany promoves!
Também tu, o meu amado,
perambule como podes ---
cante, do coração, cantos;
p'ra que não ouçam os teus prantos.
Para que não te desprezem,
indulgente sê com todos!..
Salte fora... Patrão manda
--- é p'ra isto que ele é rico.
Assim era o Perebendya.
--- Velho e quimérico humorista!
Começava cantando; depois,
caia num riso. E terminava ---
Sempre, como um menino, chorando.
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Nota:
"Ao ruão dedica um canto;
depois, à Horlytsya passa."
poderia ser:
"Ao ruão dedica um canto;
depois, à pombinha
um cantar devota."
Perebendya --- Humorista fantasista e excêntrico.
ruão --- Pelo do cavalo alazão, que tem as crinas e a cauda brancos
Horlytsya --- Uma canção dançante: " Oh!, menina-pombinha se agarra ao cossaco"
Hrytsya e Vesnyanka --- duas canções populares; a segunda, uma canção primaveril.
Serbyna e Shynkarku --- duas canções populares; Serbyna de origrn Sérvia
Sich --- Refere-se à Sich Zaporozhs'ka, criada no séc. XVI, nas regiões do Dniprovia.
A Sich foi extinta em 1775, por um decreto (ukaz) de Yekateryna II.
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04/04/2009
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